Já sou ágil? Os desafios da mente descontínua
“Nós já somos ágeis?”, “Nós falamos que somos ágeis, mas na prática não é bem assim…”, “quando vamos terminar essa transformação ágil?”, essas e outras frases eu escuto quase que semanalmente dos times em que trabalho!
Existe uma ansiedade muito grande em saber onde começa e quando termina uma jornada de transformação ágil. Assim como eu vejo que os times tem geralmente uma autoimagem sobre sua maturidade ágil bem diferente do que a realidade.
Por mais simples que sejam essas perguntas, suas respostas não são tão simples assim! Precisamos levar em consideração mudanças de mindset, culturais e amadurecimento de times e métodos. Além de todas essas nuances ao redor do tema, temos também um desafio biológico a ser considerado: o desafio da mente descontínua.
O desafio da mente descontínua
Vamos começar com um exercício, imagine que vamos acompanhar o crescimento de uma criança através de fotos tiradas a cada segundo.
Segundo a segundo, uma nova foto é tirada desde o seu nascimento até o momento da sua morte. Imagine agora que colocamos todas essas fotos uma ao lado a outra, criando uma linha do tempo do crescimento dessa pessoa fictícia.
Eu gostaria agora que você selecionasse a foto que representa o exato momento que esse indivíduo desenvolveu cabelo ou por exemplo, a exata foto em que essa pessoa passou a ter dentes.
É impossível acharmos uma foto (lembrando que foram tiradas segundo a segundo) em que esses eventos ocorreram, só é possível identificar isso se olharmos intervalos por exemplo, de meses. Se pegarmos uma foto por mês, fica muito mais fácil identificar o momento em que o indivíduo desenvolveu cabelo.
Muito da nossa dificuldade em dizer quando começa e termina uma transformação ágil, ou quando que um time pode começar a se intitular “ágil” vem da nossa dificuldade em entender o continuum que permeia um início, meio e fim de algo, coisas que nossa mente, apesar de ter dificuldades de identificar, busca de forma incansável.
Ok! Sabendo dessa nossa limitação biológica, em determinar momentos exatos de um continuum (como é o caso de uma transição entre um modelo “tradicional” e um modelo “ágil”). Como podemos entender como começa e onde termina uma transformação ágil?
Orgânico versus Estratégico
Sabendo do desafio da mente descontínua, a resposta mais fácil para determinar quando começa e onde termina uma transformação ágil, seria olhar de uma forma mais ampla para o passado e por comparação de grandes marcos na história dessa transição, apontar um momento em que o início da transformação era já evidente.
Esse marco não vai determinar o momento exato em que a transformação se iniciou, isso seria o equivalente a selecionar a foto, segundo a segundo, exata em que o nosso indivíduo desenvolveu cabelo. Mas, identificando o marco onde já era evidente que uma transformação estava em curso, é um bom caminho para traçar essa linha do tempo de uma transformação ágil.
Da mesma forma, podemos fazer esse exercício para identificar um marco de “término” dessa jornada ágil. Mas sobre o término de uma transformação ágil eu vou explorar mais a fundo daqui a pouco.
Esses cenários fazem muito sentido quando essa transformação ágil acontece de forma orgânica em uma organização, geralmente vindo dos seus colaboradores.
Quando um deles ou um grupo de pessoas conhece sobre agile e começa assim um movimento bottom-up sem perceber, a organização começou uma transformação ágil sem que houvesse uma estratégia inicial por de trás.
Mas, o contrário pode acontecer e aí as respostas ficam mais fáceis de serem respondidas. Existem situações onde a jornada de transformação ágil, pode ser feita de forma estratégica, onde geralmente a liderança do time ou da organização trás esse objetivo e cria um planejamento estratégico, dizendo quais os objetivos claros para essa transformação.
Nesse outro cenário podemos dizer que, no momento em que a estratégia é anunciada para a organização, cria-se o marco de início dessa transformação ágil. Durante toda a execução dessa estratégia, indicadores de sucesso vão sendo monitorados e quando esses indicadores atingem seus objetivos previamente definidos, podemos marcar assim o término dessa transformação ágil.
Um exemplo desse cenário pode ser visto no artigo Lições ágeis que aprendi com a Volvo, mas vale a reflexão se o marco de início dessa transição ágil, realmente ocorre no anúncio da estratégia para a organização, ou se esse marco não é mais preciso se for colocado no momento em que a discussão sobre uma transformação ágil, foi colocada em pauta no contexto estratégico.
Não existe certo ou errado, existem apenas cenários diferentes e uma percepção limitada sobre esse continuum que é uma transformação ágil.
Mas ainda temos perguntas no ar: Quando um time pode se considerar ágil? Onde está a linha que divide “ágil” de “não ágil”?
Eu já sou ágil?
Na minha série do Youtube Agile60′, sessenta segundos de conteúdo ágil, eu já comentei sobre esse tema:
A linha que divide o “ser ágil” do “não ser ágil”, cai no mesmo desafio da mente descontínua e as considerações feitas até o momento, continuam válidas quando discutimos se um time já é ágil ou não.
Fato é que a transformação ágil é uma jornada longa e complexa e na minha visão como Agile Coach, é que no momento em que incia-se uma discussão sobre agile pela primeira em vez em um time, ali se inicia sua jornada rumo a transformação ágil e a partir deste momento, eu já considero que esse time é ágil, porém bem no início de sua jornada.
Diferentemente de um time que já tem uma cultura mais adaptada, métodos mais alinhados com valores e princípios que também são ágeis, porém bem mais adiantados nessa jornada.
E quando termina uma transformação ágil?
No momento em que entendemos que melhoria contínua é um princípio fundamental da agilidade, isso responde a pergunta, que uma transformação ágil não deve ter um fim!
Se sempre há espaço para melhoria de processos, pessoas e cultura, significa que essa transformação ágil é contínua em um ambiente de agilidade e ela também se adapta, sendo que no início da jornada a transformação ágil, significa mais uma mudança cultural e de mindset e quanto mais avançados estamos na jornada, essa transformação tem mais significado em melhoria contínua de uma cultura, construída ao redor de valores e princípios ágeis.
Para saber mais sobre Mente Descontínua: